Você já ouviu falar do “corte” ou “pique” que mulheres recebem durante o período expulsivo do parto, supostamente para facilitar a saída do bebê? Este corte é feito até a camada muscular do períneo e recebe o nome de episiotomia.
Imagine a seguinte situação: você está na sala de parto, ansiosa para dar à luz ao seu bebê. A dor das contrações parece insuportável, mas você está determinada a trazer seu filho ao mundo de forma natural, seguindo o plano de parto.
No entanto, à medida que o trabalho de parto avança, o médico menciona a possibilidade de realizar uma episiotomia para facilitar a saída do bebê.
Nesse momento, você se vê diante de uma decisão difícil, em uma situação em que está com muita dor e se sente ansiosa.
Se por um lado, está a pressão do médico e a promessa de que a episiotomia pode acelerar o parto e evitar lacerações mais graves; por outro, existe o desconforto em relação a um procedimento que você nunca desejou e que agora parece estar sendo sugerido como a solução para o seu problema.
Pode ser desagradável pensar na possibilidade de ter que lidar com uma situação tão delicada. Mas o melhor é buscar informações sobre tudo o que pode acontecer no momento do parto para ter um plano prévio sobre como agir.
O ideal e o que nós esperamos é que você tenha um parto tranquilo, que tudo aconteça conforme os seus planos e que não haja nenhum imprevisto ou violência obstétrica.
Mas se algo diferente acontecer e alguém cogitar a episiotomia, você deve estar a par das informações mais relevantes sobre o assunto para tomar a melhor decisão.
Por isso, elaboramos este artigo. Acreditamos que informação é uma fonte de empoderamento para as mães, principalmente em seus momentos de maior fragilidade emocional.
Nos próximos tópicos, você vai entender melhor o que é episiotomia e por que ela não é indicada. Continue a leitura e entenda tudo sobre o assunto!
O que é episiotomia?
A episiotomia é um corte cirúrgico feito na região entre a vagina e o ânus durante o trabalho de parto para aumentar a abertura vaginal, com a promessa de facilitar a saída do bebê.
Estamos falando de um procedimento que começou a ser utilizado no século XVIII e teve sua popularidade máxima no século passado, chegando a ser feito em quase 100% das mulheres em determinados hospitais dentro e fora do Brasil.
Em outras palavras, sem nenhuma evidência de que a prática é favorável à mãe e ao bebê, ela passou a ser aplicada até mesmo nos partos de baixo risco, em que não havia nenhuma complicação.
Na teoria, o tal corte evitaria danos maiores no períneo, protegeria o bebê e facilitaria o nascimento, reduzindo o tempo de trabalho de parto e o tempo de recuperação da mãe.
Mas na época em que se tornou uma prática aceitável, não havia meios que pudessem ser usados para comprovar sua eficácia.
Ou seja, a episiotomia é uma prática que se popularizou devido a uma “propagação” entre os profissionais de saúde.
Somente depois de muito tempo, a prática da episiotomia começou a ser questionada por autoridades na área da saúde e organizações médicas devido aos seus potenciais efeitos adversos e à falta de evidências que comprovem seus benefícios.
É importante entender que, embora alguns profissionais de saúde ainda possam recomendar a episiotomia em certos casos, você tem o direito de recusar essa intervenção.
O tema é delicado e, por isso, você precisa ter acesso a informações atualizadas para tomar decisões conscientes e alinhadas com suas necessidades e desejos durante o parto.
No próximo tópico, vamos explicar melhor por que a episiotomia deve ser evitada.
Por que a episiotomia não é indicada?
Nada mais compreensível do que a confiança no profissional da saúde responsável pelo seu parto. O momento é único, delicado e marcante, mas também traz a sensação de vulnerabilidade. Por isso, ao receber a recomendação de uma episiotomia, é natural pensar que o profissional em questão está tomando a melhor decisão.
Mas para que determinada ação valha a pena, é necessário que os benefícios comprovados da prática superam seus danos conhecidos.
Existe, dentro da Medicina Baseada em Evidências, um conceito interessantíssimo que é o seguinte: “Quando falamos de fisiologia, o ônus da prova é da intervenção”.
Trocando em miúdos, quando estamos falando de um processo fisiológico (como é – ou deveria ser – o parto normal), qualquer procedimento deve se provar benéfico antes de ser feito. Caso contrário, estaremos apenas adicionando potenciais danos sem nenhuma evidência de benefício.
E adicionar danos é justamente o contrário do que prega a filosofia que orienta os médicos: Primum non nocere (primeiramente, não causar danos). Isso deveria guiar toda e qualquer conduta médica.
Pois bem, voltando ao corte no períneo de parturientes: o que sabemos? Primeiramente precisamos destacar que:
- Não temos evidências de segurança dessa prática;
- Não temos nenhuma evidência sólida dos supostos benefício;
- Não temos nenhuma indicação precisa que seja baseada em evidências;
- Já sabemos que a episiotomia não protege contra lacerações graves, pelo contrário, ela aumenta o risco de uma laceração se agravar.
Somente com essas informações, você já dispõe de argumentos suficientes para evitar este procedimento.
Mas não vamos parar por aqui. Vamos falar sobre os danos comprovados da episiotomia, que já estão bem estabelecidos na literatura médica:
- Como mencionamos, a episiotomia aumenta os riscos de lacerações graves, ao invés de preveni-las, principalmente no caso de partos instrumentais (em que temos a necessidade de aplicar fórceps ou vácuo extrator para o nascimento do bebê);
- O procedimento pode provocar disfunções sexuais no pós parto, o que prejudica a vida da mulher por um tempo prolongado;
- A episiotomia também pode causar disfunção urinária por alteração do funcionamento da musculatura;
- Esse “pique”, supostamente inofensivo, pode causar dor crônica, prejudicando a sua qualidade de vida e os cuidados com o bebê, que já são desafiadores mesmo quando se tem um parto normal sem intervenções;
- O procedimento também não melhora os desfechos para o bebê, ou seja, não interfere na necessidade do bebê ir para UTI, por exemplo, ou na mortalidade.
Enfim, é preciso ter em mente que a episiotomia, por si só, equivale a uma profunda laceração de segundo grau. E não faz o menor sentido, do ponto de vista fisiológico, fazer um corte profundo para evitar uma laceração profunda.
Já se sabe que partos bem conduzidos, com um mínimo de intervenções, sem puxos dirigidos, manobra de Valsalva (prender o ar e fazer força) ou Kristeller (apertar a barriga da mãe para o bebê sair mais rápido), resultam em períneo íntegro, sem lacerações, e funcional em cerca de 50% dos casos (alguns estudos falam em até 60%). E nos casos em que há lacerações, grande parte delas é de primeiro grau.
Os estudos relacionados à prática do procedimento em sua maioria tentam avaliar a episiotomia “de rotina” (feita em todos os partos) em comparação com a episiotomia “seletiva” (feita a critério do profissional).
Já se sabe que quanto menos episiotomias (grupo “seletivo”), menores serão as possibilidades de lacerações graves, morbidades e infecções.
Outros estudos, que comparam a episiotomia seletiva com nenhuma episiotomia encontram resultados semelhantes entre ambas: ou seja, a episiotomia não trouxe benefícios às mulheres que passaram pelo procedimento.
Em resumo, simplesmente não há até hoje uma única indicação de episiotomia que faça sentido do ponto de vista das evidências.
Os riscos, por sua vez, já são bem conhecidos. Cabe agora a atualização e a conscientização contínua dos profissionais e da sociedade para que as mulheres não sejam mais cortadas sem necessidade durante o parto.
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